26 de junho de 2014

Do tempo

O que me toma o tempo
O que me toma o tempo é o tempo que o tempo me toma.
O que me toma o tempo é duo, dúbio.
É ora amor, ora ódio puro.
O que me toma o tempo é a falta.
O tempo não meu, a sobra.
Mas também me toma a surpresa do tempo doado.
O que me toma o tempo é a consciência do tempo perdido.
Tempo moído, gasto, chato.
O que me toma o tempo é o anseio por ele.
A espera, a angústia, o anseio seco e sedento.
O que me toma o tempo não é o desperdício.
Não são outros, não são só mais uns instantes, tampouco o mais um pouquinho.
O que me toma o tempo é o espaço que com ele se funde e me confunde.
O não espaço.
O não tempo.
Mas há sorte
Porque me toma mais o tempo a eternidade do abraço.
O silêncio do olhar sincero.
A mão dada na verdade.
E o desejo de tempo.

E o tempo passa.
Até passar.

10 de dezembro de 2013

Des-abafo.

Você é aquele que nunca deveria ter sido.
A fraude mais verdadeira.
Meu descompasso.
Aquele da foto que odeio e procuro ver repetidamente.
A dor que fere e causa prazer.
Meu masoquismo.
Você é a consciência mais cheia de vontade de ser inconsciência.
Um descontentamento contente, infelizmente.
Minha raiva barroca.
Aquele a quem minha ignorância clama por ser ignorado.
O disco que mais gosto, mas todo riscado.
Minha inutilidade guardada.
Você, a causa das consequências.
O pretérito mais-que-perfeito de aspecto imperfectivo.
Meu particípio gerúndio.
É o ainda pedindo para ser certa vez.
A linha tênue entre meu maior ódio e meu maior amor.
É o meu você.
Pedindo.
Clamando.
Suplicando.
Para ser desvocê.



31 de julho de 2013

Singelo som

Já não dá para esconder, negar, fugir, correr.
Unânime sentido.
Não se pode mais pensar em não pensar, não dá.
Inenarrável sentimento.
O que nos escolheu é par com o mar e o verso meu encontrará o seu e se fará o real
Real viver

Me deixarei levar pela canção que sai dos olhos teus e vem tocar os meus, e me faz restaurar,
Adolecer meu ser.
Fato que o  que já nos fez compreender os tons
Reconhece-se no ar, no mais singelo som:
Amor.

                                                                                                                                                                                                                                                   



12 de outubro de 2012

Quando ser feliz dói.

As horas passavam depressa. Não as horas, os segundos. Eu os sentia passando por mim sorrindo com ironia. Eu abraçava aquele corpo tão perto do meu. Fechava meus olhos na ânsia de parar o tempo, eternizar o momento. Em vão. Sentia o cheiro do cabelo agora mais curto, ainda tinha o mesmo cheiro. Eu não queria chorar, eu não podia. Involuntariamente senti a gota escorrer pelo rosto e escolher sua camiseta vermelha como lugar para pouso. Pensei que aquela lágrima na camiseta seria um jeito de ficar um pouco contigo mesmo indo embora, como ir à praia e recolher um pouco de areia para guardar como lembrança. Grande bobagem. A respiração ofegante que movimentava meu braço recostado naquele corpo me fez despertar. Olhei aquela sala. Por um momento pensei que tudo aquilo era pecado, mas o que meu coração sentia me absolveu. De repente começou a doer. De longe o vi vestindo suas calças, colocando a camiseta, me lembro de ter me perguntado se tinha ficado bom, não lembro se respondi. A porta se abriu, eu sabia que não voltaria ali por muito tempo, talvez nunca mais. Foi assim que entendi a dor que a felicidade pode causar.

12 de janeiro de 2012

Sobre os nomes.

E Deus chamou de homem. E Platão nominou. Para tudo: um nome. Ano após ano, palavra após palavra, línguas e mais línguas, nomes e mais nomes. João, Rodrigo, Pedro, Fabrício, Nikolas, Alan, Luiz. Às coisas, nomes. Aos sentimentos, nomes. Paixão, amor, tesão, ódio, ciúmes. Há quem diga que não se pode e nem se consegue nominar. Shopenhauer, Kierkegaard, Nietzsche. Mesmo assim, para tudo, um nome. Caçarola, pênis, copo, telhado, namoro, situação, aparelho, viagem, parceiro, praia, cinema. De tantas coisas nominadas. Infinitas coisas. Uma parece permanecer sem nome. Indefinida. Pendurada apenas numa pergunta:




E nós?

11 de janeiro de 2012

Do equilíbrio.

Você pensa em bolacha, eu penso no pacote.
Você se mata no cigarro e na bebida, eu já passei disso, hoje estou nos livros, bêbado nas teorias, fumo filosofia.
Você usa seu tempo sei lá com que. Eu fico imaginando no que você usa seu tempo.
Você ignora as coisas cotidianas. Eu imagino o que fazer para você parar de me ignorar.
Você gasta seu dinheiro com chips e coca-cola enquanto eu economizo para poder ir te ver.
Você tem galera, eu amigos.
Você vai ao shopping, eu escrevo artigos.
Você quer parque de diversões eu prefiro Paris.
Você brinca de romance, eu romanceio brincadeiras.
Você finge que não entende, eu finjo que não sei.
Você me toma o tempo, eu me deixo ser tomado.
Você.
Eu.
E a vida se equilibra em seus pólos.

18 de outubro de 2011

Feno.

Tinha ido sozinho, escondido de qualquer um. Solitário, bebia um uísque, o mais barato, recostado no balcão do pub. Misto de insegurança, vontade de sumir e raiva subiam-lhe do estômago que queimava e arranhavam o pescoço ardidamente. Deu um gole seco na bebida, odiava uísque. Olhou ao redor e uma vontade de rir de desespero foi interrompida pela lágrima que parecia embaçar o ambiente hostil. Alguma música antiga trazia a ideia de passado, mas ele o sentia recente. Ele havia escolhido, não poderia reclamar de nada, se tinha alguém culpado aqui era ele mesmo. Odiava se culpar e se odiava por culpar-se. Alguém passou à sua frente, sorriu com ares de amor. Apertou o copo com muita força, queria mesmo era estourá-lo, mas sua mão era tão fraca quanto sua alegria. Outro alguém passou, encarou-o, mas com ares de quem quer ser comido, estraçalhado. Retornou um sorriso de malícia, agarrou o cara apertando forte o lado de sua costela e puxou-o para perto. Sentiu o coração do outro acelerado e a respiração ofegante, o corpo tremia em suas mãos, agora seguras. Atracou sua boca rígida naquela boca macia e enfiou a língua de raiva. Abriu seus olhos e viu um cinzeiro ao longe, o gosto da cinza apoderou-se do lugar e ele largou a boca, mirando um ar de desentendimento.  Deixou uma nota de cinquenta em cima do balcão e todos o olhando. Queria mesmo era que uma única pessoa o enxergasse naquele momento. Eu te odeio. A rua parecia correr abaixo de seus pés. Eu te odeio. Não sabia se estava gritando ou chorando, sentia um misto de tudo. Eu te odeio. Logo ele que estava tão imune. " - Odeio!", berrou do alto do viaduto deserto. Idiota. Era assim que se sentia. Eu me odeio. E repetindo algum nome que não queria, esqueceu-se. 

15 de outubro de 2011

Sintonia

Ele andava só.
 Ele também.
Ele não acreditava mais nisso de paixão, amor.
 Ele também não.
Ele teve sorte.
 Ele também.
Ele não acreditou que aquela pessoa pudesse o notar.
 Ele também não.
Ele decidiu.
 Ele também. (Embora tenha hesitado)
Ele se abriu, se declarou.
 Ele também.
Ele corou.
 Ele também.
Ele ficou feliz.
 Ele também.
Ele agora é dele.
 E ele também.